Está a Nevar
Está a nevarApetecia-me depositar o meu corpo nu
Na relva do jardim
E confiar à frescura dos flocos melancólicos
O apaziguamento dos meus nervos em chamas
Na casa, aqui e ali
Os sinais evidentes das fúrias que me dominam
Numa exaltação de dor prisioneira
A jorrar de um vulcão incalculável
É triste, este viver aos solavancos dentro de mim
E só chegar aos outros
Em pantominas de excesso
Escuridão rasgada em raios assustadores
Feridas regadas com a gasolina
Que o tempo entendeu espalhar
Numa composição de loucura
A aranha que me tece
Não desiste
Franqueia todas as portas
E os muros que ergo
Nos soluços dos dias
De tanto, querer o sal nas minhas jornadas
Escavo mais e mais na minha permanência
Grutas e túneis sem sentido
Labirintos de caminhos que já esqueci
Territórios bastardos das crenças
Que já me abandonaram
Relógios parados de ponteiros quebrados
Em esgares de morte
Se ao menos, houvesse uma frecha de luz
Na minha penumbra
Se o sol viesse encantar a minha tarde
Em melodias douradas
Se o mar me abraçasse numa libertação
De redes torpes
Talvez eu pudesse ser uma concha de paz
E eternidade
Ana Wiesenberger
07-02-2013
Imagem - Odilon Redon