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querotrazerapoesiaparaarua

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Todos Somos Árvores

Pedro César Teles
Todos somos árvores
Diz Raul Brandão em Húmus
E se assim for, em vez das sete idades
Do Homem de Shakespeare
Assumimos as quatro estações
Num calendário de vida

Como se a infância fosse a alegria
Da Primavera a despontar em nós
Uma multiplicidade de capacidades
Um rompimento verde a ganhar forma

Depois, na euforia do Estio
Já somos frondosas, vitais
E apetecíveis
Num esplendor de querer adulto
A amadurecer horas que parecem
Intermináveis

E contudo, o Outono apodera-se de nós
Aos poucos, sorrateiro
E transforma o nosso viço
Numa paleta mirabolante de ocres e castanhos
Que se despedem de nós numa carícia breve
Para abraçarem o solo

E por fim, a invernia consome-nos com ventos
Frios em hastes secas, tristes
Doentes terminais saudosos de Sol
Já destinados ao mundo das sombras

Mas o ciclo da Natureza perpetua-se
E as árvores, ao contrário de nós
Renovam o alento quando o tempo voltar a aquecer
Nós só o poderemos alcançar nos resquícios
Do nosso sopro na vontade dos que amámos
E foram próximos de nós

Ana Wiesenberger
20-12-2013

Imagem - Pedro César Teles

As Pessoas Sós Passam O Tempo

Henri Toulouse Latrec
As pessoas sós passam o tempo
A deslizarem interminavelmente
Pelos corredores dos seus pensamentos
Construídos na ausência, na exclusão
Dos ecos das outras vozes
Que talvez desejassem perto, às vezes

Arrastam cada detalhe com cuidado
Como se pisassem vidros finos
E cada novo trilho é sempre a procura
Do indefinível na trivialidade da aparência
Dos factos quotidianos

Erram os olhos numa distância íntima
Entre sombras e prenúncios de formas
Que deslindam com vagar
Como se caminhassem à beira-mar
Numa demanda de conchas pequeninas
Suspensas numa filigrana de espuma breve

E quando lhes acontece estar entre os outros
Desatam esgares em vez de sorrisos
Desajeitadas, distraídas dos gestos convencionais
Mal articuladas em frases soltas
Num trapézio de expectativas vãs
De se verem compreendidas

E depois regressam ao seu espaço
Calçam os seus passos inseguros de exterior
Com as pantufas de feltro velho dos seus sonhos
E aninham-se na poltrona puída de uma saudade
Singular a tecer fios novos para a sua teia
Com a consciência triste de ser aranha e mosca
Em simultâneo
Num conluio de estranheza

Ana Wiesenberger
01-06-2014

Imagem - Henri Toulouse Latrec

Hoje Ouvem-se Os Pássaros A Cantar

Van Gogh
Hoje ouvem-se os pássaros a cantar
E há sol, por isso é Primavera
Amanhã talvez seja Inverno como ontem
Ou Primavera como hoje
No norte da Europa vive-se esta incerteza
Nos dias

No sul é diferente
O mal-estar esconde outras razões mais profundas
É a fome, o desemprego, a raiva perante a injustiça
E também a mornidão
Tanta gente que não vê ou pensa
Ou não quer ver, nem pensar
Porque é incómodo ou porque a realidade os levaria
A subtraírem-se ao medo de agir
E o desfiladeiro derradeiro lhes acenasse com a força
Com que nunca viveram os dias

Os pássaros continuam a cantar
Algumas raparigas nigerianas já foram resgatadas
Há muitas ainda para recuperar
Na Nigéria longínqua, na Ásia distante
E nas gaiolas dissimuladas do velho continente
Tão civilizado e tão cruel

É melhor recordar Shakespeare em MacBeth
Não nos entreguemos a tais pensamentos
São de enlouquecer
E porém, o leque das horas abre sempre mais
Recantos esconsos que pretendemos não ver
E vemos com os olhos petrificados de angústia
Com ânsias de erguer tempestades
Fazer acontecer mudanças
Colorir o espaço com o punho individual
Finalmente útil
Finalmente humano

Ana Wiesenberger
30-05-2014

Imagem - Van Gogh

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