A vida podia ser tão simples Se não fora complicada Se não fora estúpida E obtusa E tensa E densa E desperdiçada Todos os anos Todos os meses Todos os dias Todas as horas Todos os momentos Em que simplesmente Perdemos a nossa sombra E nem temos a coragem De parar Para a procurar
Adoecem-me as pessoas piegas Sem razão Tão entretidas entre as suas mágoas Light Que não vêem os pássaros mortos No passeio Que não sentem o frio do abandono Dos cães que erram esfaimados Pela cidade
Adoecem-me as pessoas importantes Sem substância, nem conteúdo, que valha Adquirir Iluminadas pelas suas roupas plumosas e Vistosas A respirarem euros, das marcas A condizer Com os dias e os lugares por onde Passeiam
Adoecem-me os pobres de espírito Cheios de si A encherem os cafés com caudais de vozes Exaltadas à toa Das suas convicções de pacotilha Que munidas de garrafas de cerveja Bafejam o ambiente, com a vitória dos seus clubes E os erros dos árbitros, dos quais conhecem melhor os passes Dos que os esgares, das mulheres com quem Dormem
Adoecem-me os maneirismos educados Dos intelectuais convencidos Da imensidão dos seus conhecimentos Que entretêm as multidões, do lado de lá Do ecrã Nas salas apertadas, entalados entre preocupações reais E pouca fé num amanhã de sol
Por isso, fico em casa, quietinha, de televisão desligada Com a cabeça em curto-circuito, intermitente E deixo deslizar as horas, enquanto tento aprender A pensar Ana Wiesenberger in Liberdade