A Ausência do Mar-pátria
A ausência do mar-pátria
Desata em mim miríades de delírios
Um estar por aqui e já não estar
Um quase querer abandonar a vida
Por não poder respirar
A alma confinada nesta saudade imensa
Sarcófago onde adoece a esperança
Corredor lúgubre e infinito
Que me faz acreditar não haver luz
Para banhar os meus sentidos
Erro os olhos à volta
E nada vejo que os prenda
Adoeço presa de ecos e visões absurdas
Como se por detrás das minhas pupilas
Vivessem postais ilustrados de cores berrantes
A imporem etiquetas a eito em paisagens
Como se uma cidade, um rio, um país
Fosse aquilo
E a minha capacidade de sonhar
Estivesse amortalhada pela lente do medo
De saber-se prisioneira de um tempo mudo
Sem contornos, sem prenúncio de beleza
Um arco-íris a acontecer numa gravura
De uma infância há muito vivida
Talvez, lamentavelmente nunca esquecida
Um desejo de retocar molduras do passado
Com o sangue do sacrifício de um presente
Sempre adiado, cada vez mais irreal
Como uma vida passada
Que se pensa ter vivido
Dimensão suspensa de uma Atlântida renovada
Em anéis enfeitiçados por um Deus louco
Por lágrimas humanas
Ana Wiesenberger (in Corredores)
29-08-2014
Imagem - Max klinger