A Páscoa
A Páscoa era o almoço num restaurante rústico
Com parque para a pequenada
E jogo da malha para o meu pai e os outros
As mulheres conversavam engomadas em vestidos novos
E cabelos emproados enquanto descansavam os pés castigados
Pelos sapatos ainda muito apertados nos banquinhos de madeira
E lá iam vigiando as crianças por entre as rendas e as novidades
Da semana
A Páscoa era a visita obrigatória aos afilhados
As amêndoas e as prendas, os pratos atafulhados
Folares, ninhos e fios de ovo a condizer com a promessa
De renovação da vida
E depois, veio a Páscoa em que o borrego se transformou
Em raiva e sangue dentro de mim
Quando, ao regressar a casa, te encontrei inerte e fria
E os restos guardados para ti com amor
Se tornaram lixo e desperdício
Quando te enterrei
Sei bem, que uma grande parte de mim
Foi a enterrar
Contigo
As décadas sucederam-se
Mas desde então
A Páscoa só me sabe a morte
Não chega a assumir qualquer ressurreição
Na minha mente não há ovos coloridos
Que consigam tapar a imagem de um dos seres
Que mais amei
Só, hirta e fria
Ana Wiesenberger
03-04-2015
Imagem – Domínio público (internet)