As Pessoas Sós Vivem No Silêncio
As pessoas sós vivem no silêncio
Ou no ruído impessoal
Nas vozes que moram no radio
E na televisão
Na harmonia da música
Que escolhem ou não escolhem
Mas escutam
Em horas improváveis ou não
As pessoas sós vivem, às vezes
Em bairros virtuais
Onde as campainhas são teclas
E as saudações, ícones engraçados
A abrir e a fechar sorrisos
E abreviaturas cómodas
Que nada querem dizer
Mas a que se habituaram
As pessoas sós
Procuram outras pessoas sós
Para se sentirem acompanhadas
E depois surpreendem-se
Pelo passo vão
Pela distância insuperável
Abissal
As pessoas sós desaprendem
A companhia
Mumificaram no eu
Os outros ecos
Exilaram-se do toque humano
Deixam cair as mãos ao longo do corpo
Numa higiene de separação sem ponte
Isenta de abraço
As pessoas sós
Coleccionam muitas noites de vácuo
De lágrimas, talvez
E acostumaram-se a dar uma volta pela casa
Antes de recolher ao leito
Precisam de verificar portas, janelas, botões
De electrodomésticos
Antes de fecharem o dia
Com uma pressão brusca no interruptor da luz
E a esperança que o sono lhes traga o sonho
Do que não conseguiram ser
Ana Wiesenberger
11-04-2013
Imagem – Ray Caesar