Não sei, se foi o verbo nos teus lábios
Não sei, se foi o verbo nos teus lábios
Que me prendeu o olhar, a atenção
Ao teu porte carregado de ironia
E distanciamento crítico pelas coisas
À frente do anfiteatro
Antes e depois dos seminários
Falávamos muito e a tua proximidade
Apetecia-me de um modo diferente
Difícil de catalogar
Talvez, não fosse bem isso
Talvez eu me recusasse a fazê-lo
Por recear, perder a dimensão
Do que é sensato, normativo
Ideal
No entanto, quando a idade avança
E a memória dobra em nós
A multiplicidade de momentos vividos
Permitimo-nos, por vezes
Vaguear para longe dos nossos pressupostos
E resta-nos admitir a estranheza de tantos Eus
Que fomos e deixámos pelos caminhos
Unhas dolorosas que cortámos e voltaram sempre
A crescer
Na penumbra dos nossos esconsos
Nos armários dos nossos quartos
Que invadem a nossa vigília
Quando apagamos a luz para descansar
Ana Wiesenberger
2013
Imagem - François Boucher