Quando Passavas na Avenida
Quando passavas na avenida
Com o teu passo elástico
Eu seguia a energia do teu corpo
Com a gula de um gato
A mirar um pires de leite
A deslocar-se para longe
Dos seus bigodes ávidos
Entretive-te no meu olhar
Passeei-te pelas minhas palavras
Senti o esforço dos teus músculos tensos
A dominar o arco das tuas expressões
Do teu ser inquieto, altivo e distante
Adivinhava-te no fogo dos olhos
O calor da tua libido cintilante
Estremecia colada à brusquidão
Dos teus movimentos naturais
Que em mim suscitavam desejos
Que eu não queria assumir
Apetecia-me entrar nos teus sonhos
Sentir cada centímetro da tua pele
Sob os meus lábios
Abocanhar-te a nuca quente
Misturar-me contigo
Numa dimensão alucinada
Ser seiva e raiz
Uivo e rugido
Num bosque de outra era
E contudo, só as nossas mãos se tocaram
Ao de leve, num momento breve, desajeitado
Na troca de um livro
De que ambos gostávamos
E toda a paixão
A real e a imaginária
Esvaiu-se por entre Os Vagabundos de Gorki
Adormeceu no colo de Teresa Raquin
Ana Wiesenberger
(in Erotismus, Impulsos E Apelos)
Poema dito no programa "Amantes da Poesia" de Maria Isabel Rodrigues, na Popularfm