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querotrazerapoesiaparaarua

querotrazerapoesiaparaarua

Andam Figuras Altivas, Desconhecidas

Andam figuras altivas, desconhecidas
A passear dentro de mim

 

Os sentidos embotados fazem-me crer
Que não sei, para onde ir
Ou o que fazer

 

Tacteio possibilidades no escuro da minha mente
Mas não vislumbro nada além dos pirilampos psicadélicos
Dos rostos que perdi

 

As árvores oscilam e dobram-se sobre mim
Numa carícia de orvalho fraco de Verão

 

Queria ler
Não consigo
Tenho um caldeirão cheio de palavras
A fervilhar no meu sangue

 

A tarde vem e não vem
E eu quero ir com ela
Para junto do mar

 

Porque receio ir, então?
Se anseio por mergulhar na água fria
E de facto, só é Outono no calendário

 

É talvez a vontade envergonhada de seguir
Pela estrada azul, esverdeada
Sempre a direito
Até ao meu castelo ditoso
De menina do mar

 

Ana Wiesenberger
29-09-2009

Imagem – Edmund Dulac

 

O Vazio Prolonga As Horas

Arthur Rackham
O vazio prolonga as horas
Estica os minutos em não-ser
Não-estar, não-ver, não-sentir

Se ao menos, ao acender uma vela
Comunicasse a vontade de luz
Orientação numa escuridão medonha
Que me atormenta
Incompreensível para um ser da noite

O que paira sobre mim é a dor
Os dentes aguçados do que não quero
Assumir ou compreender

Sempre quis inventar caminhos
Sempre fiz trilhos, vias abertas
E agora pareço um morcego embriagado
De estranheza
A embater nas esquinas dos muros
Esquecido de um radar ancestral
Que lhe daria a paz dos percursos
Conhecidos, apetecidos

Amanhã permanecerá ainda
O grito contido, estrangulado
Desabituado de habitar a garganta

Ana Wiesenberger
19-08-2014

Imagem - Arthur Rackham

Estou Cansada de Memórias

Arthur Hughes

 

Estou cansada de memórias
De salas de espera arrumadas em cubos
Como aquários de grilos sibilantes

Já mandei calar o Watson e o Sherlock Holmes
Disse ao Eça que fosse govarinhar para longe
E ao Brecht que fizesse uma revolução

Eu estou fatigada de ecos dentro e em redor de mim
Já não encontro chaves à espera que eu lhes pegue
Já não distingo a Fada Boa da Má
E desisti de ir até Oz

Vou desintegrar-me em palavras vãs e audiências
A condizer
E fingir-me leda, completa, toda adaptada ao vazio
Das vozes que me estreitam pretensamente perto
E cada vez mais longe de mim

Vou exilar-me nas montanhas do sono e do sonho
Onde a beleza ainda acontece e eu não tenho frio
Nem fome de ser e estar
Onde os seres pequeninos são mestres e sábios
E sabem ouvir e ensinar
Onde não há espaço para mentiras ou inverdades
Onde a transparência das almas se entrelaça
Numa harmonia expansiva de um arco-íris sem par
E ninguém precisa de se justificar
Para existir

Ana Wiesenberger
03-04-2014

Imagem - Arthur Hughes

Na Cabeça Vazia Pesam-me AS Vozes

Albert Birkle

 

Na cabeça vazia pesam-me as vozes
Que não consigo escutar
Oiço-as já, só como ruído, perturbação
Do meu silêncio arrebatador

Quebram-se nas pontes os pilares dos sentidos
A que me agarro em vão
E despenho-me numa imensidão de incerteza
Aguarela tépida a esfumaçar fios tremendos
De tempo e tempos por adivinhar
São cruzes ou são corvos
Que os meus olhos cansados descobrem
No horizonte tenaz da minha paisagem interior

Não consigo agarrar os contornos das coisas
As muralhas são redes envenenadas por medos
Dos ecos dos meus fantasmas febris

Os olhos dobram-se sob o peso dos séculos
Catedrais dispersas de Deuses reais e irreais
Que me rasgaram o peito em preces absurdas

Escuto agora a água a cantar numa fonte qualquer
Que ainda sangra dentro de mim
Centopeias melodiosas de sonhos

Ana Wiesenberger
27-05-2012

Imagem - Albert Birkle

Afastei-me do Mundo Real

Imagem: Tom Roberts

 

 

 

Afastei-me do mundo real

Devagarinho, a medo

Como quem quer ver outro horizonte

Mas não se atreve a procurá-lo

 

De passos lassos e leves

Submergi na dimensão eléctrica do metal

O frio da superfície assustou-me

Mas depressa me habituei

 

Para quê desbaratar as minhas energias

Pela casa

Se posso usar apenas a mão direita

Para clicar, clicar

E esquecer na volúpia da multiplicidade de imagens

Que perdi a margem

 

Para quê desejar

O tacto, o odor

Além da macieza do vosso pêlo

De amor profundo

 

E depois

Tenho mais, muito mais, ainda

Nas páginas que pululam na minha cabeça

Que se agigantam nas estantes

A cobrir os muros do meu habitat

 

A dada altura, eram só paredes

Mas arrependi-me

O único hóspede que espero com ardor

É o sol

E mesmo esse,

Não se senta comigo, em todas as horas

 

Por isso, imolei os meus dias

E as minhas madrugadas

Ao contacto doce do Rato entre os dedos

Numa beatitude

De quem sabe, que não espera a morte

Porque já a alcançou.   

 

Ana Wiesenberger in Dias Incompletos

Serão Duas, As Estradas

Serão duas, as estradas
Que me levam para casa
Serão duas, as estradas
Num único propósito
De me recolher dos caminhos
E me abrigarem do mundo

Serão duas demais
Quando nem uma consigo
Conter em mim
Quando a febre do meu ser confuso
Desatina gargalhadas de lava e cinza
Num borbulhar de dor

Serão duas e eu nada vejo
Na penumbra dos meus dias de esquecimento
Do que fui, do que sou, do que serei

Serão duas luzes, duas estrelas
A iluminar a noite imperscrutável
Da minha vida

Serão duas as mãos que me levantam
Do pó do meu canto
Da nudez dos meus pensamentos
Que me dominam sem trégua
Nem misericórdia por fundar

Serão duas as existências
De rumos fundidos
Numa tapeçaria louca que construi leviana
No tempo do não ser

Serão duas as extremidades em que vigilo
A minha respiração fantasiosa
Com medo que o meu ser decida
A morada do silêncio final

Ana Wiesenberger
06-01-2013Maximilián Pirner - Sleepwalker

Drifting

Drifting

Este barco não tem remos
Deitei-os fora
Borda fora, como tudo o mais
Os mantimentos
A água doce
As bóias
Não, os livros, nunca
Esses ficarão comigo
E os cadernos e as canetas também

Às fotografias nunca dei importância
São mentirosas
Já estava cá, antes de vir
Estarei aqui, depois de partir

Ana Wiesenberger
25-10-2004
The Lady of Shallott - John William Waterhouse

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